quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Direito Penal. Concurso de Crimes: concurso material e concurso formal (parte 1)



A. CONCURSO DE CRIMES

 

A.1 CONCEITO e ESPÉCIES

Ocorre quando o agente com uma ou várias condutas realiza pluralidade de crimes.

Obs: Todos os crimes admitem concurso de delitos? SIM, TODOS ADMITEM! Doloso-doloso, doloso-culposo e culposo-culposo. Todas as infrações penais admitem concurso de delitos. Umas infrações podem admitir só uma espécie, outras, somente outras espécies, mas todas as infrações penais admitem concurso de delitos.

 

A.1.1 CONCURSO MATERIAL ou REAL


Art. 69, CP - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido. No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção, executa-se primeiro aquela.

Requisitos: pluralidade de condutas (2 ou mais condutas, ação ou omissão) gerando pluralidade de resultados.

Espécies: o concurso material pode ser homogêneo (pluralidade de crimes idênticos) ou heterogêneo (pluralidade de crimes diversos).

Regras de fixação de pena: havendo conexão entre as infrações penais, com a consequente unidade processual, a regra do concurso material é aplicada pelo juiz que profere a sentença condenatória. Caso, porém, não exista conexão entre as diversas infrações penais – objeto de ações penais diversas -, as disposições do concurso material serão aplicadas pelo juízo da execução.

Exemplo de fixação de Pena no caso de concurso material entre os crimes de estupro e roubo: (SANCHES)

ü  1º) Vai aplicar a primeira, segunda, terceira fase para o roubo, chega numa pena definitiva, vai fixar regime e analisar a possibilidade de substituição ou não. Vamos supor que você chegue numa pena X.

 

ü  2º) Vai aplicar a primeira, segunda, terceira fase para o estupro, chega numa pena definitiva, vai fixar regime e analisar a possibilidade de substituição ou não. Vamos supor que você chegue numa pena Y

 

Em seguida, soma-se as penas (X + Y). Ou seja, o juiz irá fixar cada pena individualmente (princípio da individualização da pena). Lembrando-se que, caso esses dois crimes estejam no bojo de um mesmo processo, a soma será realizada pelo juiz da sentença condenatória. Por outro lado, se o roubo estiver em um processo e o estupro em outro, quem irá fazer a soma é o juiz das execuções penais (LEP, art. 66, III).

 

Na imposição cumulativa de penas de reclusão e detenção, observe a parte final do art. 69, CP: “no caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção, executa-se primeiro aquela.” Primeiro a reclusão e depois a detenção, mesmo que o tempo da detenção seja maior.

 

Em se tratando de cumulação de pena privativa de liberdade com restritiva de direitos, somente ocorrerá a substituição dessa restritiva de direitos, caso a pena privativa de liberdade esteja suspensa (sursis).

 

Art. 69, § 1º, CP - Na hipótese deste artigo, quando ao agente tiver sido aplicada pena privativa de liberdade, não suspensa, por um dos crimes, para os demais será incabível a substituição de que trata o Art. 44 deste Código.

Se em um dos crimes houve imposição de pena privativa de liberdade não poderá ocorrer a substituição por restritiva de direitos para os demais delitos, SALVO se essa privativa de liberdade estiver suspensa nos termos do art. 77, do CP.

 

Segundo MASSON, por lógica, também será admissível a aplicação de pena restritiva de direitos quando ao agente tiver sido imposta pena privativa de liberdade, com regime aberto para seu cumprimento, eis que será possível o cumprimento simultâneo das duas.

 

O art. 69, § 2º, resolve o problema quando o juiz eventualmente tenha que aplicar restritiva de direitos para ambos os delitos.

 

Art. 69, § 2º, CP - Quando forem aplicadas penas restritivas de direitos, o condenado cumprirá simultaneamente as que forem compatíveis entre si e sucessivamente as demais.

 

As penas podem ser cumpridas simultaneamente? Prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária? Pode. Elas não podem ser cumpridas simultaneamente, duas prestações de serviços à comunidade, por exemplo? Então, ele cumpre uma e depois cumpre a outra.

Sobre o concurso material e a possibilidade de suspensão condicional do processo, entende o STF que: “A suspensão condicional do processo somente é admissível quando, no concurso material, a somatória das penas mínimas cominadas não supera um ano.”

Por último, no caso de concurso material, não será aplicada a somatória de penas na eventualidade de analisar sobre a prescrição. Art. 119, do Código Penal. A prescrição de cada crime é individualizada:

Art. 119 - No caso de concurso de crimes, a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um, isoladamente.

 
A.1.2 CONCURSO FORMAL ou IDEAL

 
Art. 70, CP - Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade. As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior.

 

Requisitos: conduta única gerando pluralidade de crimes.

Cuidado! Conduta única não importa, necessariamente, em ato único. A conduta pode ser fracionável em diversos atos, como no caso daquele que mata alguém (conduta) mediante vários golpes de faca (atos).

STF: roubo qualificado consistente na subtração de dois aparelhos celulares pertencentes a duas pessoas distintas, no mesmo instante, configura-se concurso formal. Trata-se de ação única que teve como resultado a lesão ao patrimônio de vítimas diversas, e não crime único. (HC 91.615/RS).

Espécies: Quando os crimes praticados forem idênticos ocorre o concurso formal homogêneo (dois homicídios culposos praticados na direção de veículo automotor) e quando os crimes praticados forem diferentes caracterizar-se-á o concurso formal heterogêneo (o mesmo acidente mata uma vítima e provoca lesões leves em outra, homicídio culposo e lesões culposas).

Em outra classificação, o concurso formal pode ser próprio (perfeito ou normal), quando a unidade de comportamento corresponder à unidade interna da vontade do agente, isto é, o agente deve querer realizar apenas um crime, obter um único resultado danoso. Não devem existir — na expressão do Código — desígnios autônomos. Exemplo: o agente, com uma conduta, pratica dois crimes: A e B. O crime A é doloso e o crime B é culposo. Ou então o A é culposo e o B é culposo.  

Mas o concurso formal também pode ser impróprio (imperfeito ou anormal). Nesse tipo de concurso, o agente deseja a realização de mais de um crime, tem consciência e vontade em relação a cada um deles. Ocorre aqui o que o Código Penal chama de “desígnios autônomos”, ou pluralidade de desígnios, que seria o propósito de produzir, com uma única conduta, mais de um crime. Os vários eventos, nesse caso, não são apenas um, perante a consciência e a vontade, embora sejam objeto de uma única ação.

Regras de fixação da pena: enquanto no concurso formal próprio adotou-se o sistema de exasperação da pena, pela unidade de desígnios, no concurso formal impróprio aplica-se o sistema do cúmulo material, como se fosse concurso material, diante da diversidade de intuitos do agente (art. 70, § 2º). Enfim, o que caracteriza o crime formal é a unidade de conduta, mas o que justifica o tratamento penal mais brando é a unidade do elemento subjetivo que impulsiona a ação. (BITENCOURT)

Cuidado! Seja concurso formal homogêneo, seja concurso formal heterogêneo, aplica-se o sistema da exasperação. O que significa isso? A pena escolhida será aumentada de 1/6 à metade.

E o juiz vai aumentar variando conforme o quê?  STF e STJ. 1/6 à metade varia conforme o número de infrações.

Nº de Crimes
Aumento de pena
2
1/6
3
1/5
4
¼
5
1/3
6 ou mais
1/2

 

Obs: no caso de serem perpetrados 7 ou mais crimes, deve-se aplicar o montante máximo de aumento (1/2) relativamente aos seis crimes, ao passo que os demais serão considerados como circunstâncias judiciais desfavoráveis para a dosimetria da pena-base (CP art. 59, caput). (MASSON)

 

O concurso formal foi feito para beneficiar o réu. Então, é perfeitamente possível um caso em que um concurso formal acaba sendo pior do que um concurso material.

Exemplo: Homicídio doloso mais lesão culposa. Uma só conduta (um tiro), mata uma pessoa e, por aberratio ictus, fere outra culposamente (129, § 6º). A pena do homicídio é de 6 a 20 anos. A pena da lesão é de 2 meses a 1 ano. Como houve concurso formal, haverá a escolha da pena mais grave. Pena de 6 anos majorada de 1/6 à metade. Ainda que tenha majorado do mínimo, essa pena de 6 anos vai para 7 anos. Entretanto, se, ao invés de exasperar, tivesse somado 6 com 2 meses, a pena seria de 6 anos e 2 meses. Então, para o agente foi pior o concurso formal. Então, deve-se esquecer o sistema da exasperação e somar as penas individualmente. É o chamado cúmulo material benéfico ou favorável, quando, em alguns casos, o sistema do cúmulo material for melhor que o da exasperação, prevalecendo sobre este.

Art. 70, parágrafo único - Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do Art. 69 deste Código.

Memorizar!

ü  Exasperação é só para concurso formal perfeito e, mesmo assim, se o cúmulo material não for mais benéfico.
ü  Concurso material imperfeito ou impróprio (nós temos o art. 70) tem que somar as penas. Vai ser tratado, na soma das penas, como se fosse material.

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