quarta-feira, 27 de maio de 2015

Está com sono? Vá de resolução de questões.


Quando meu cérebro empaca na leitura, fica disperso e/ou sonolento, levanto da cadeira, dou uns pulinhos, me estico toda, faço um cafezinho e começo a resolver questões.

A resolução de questões é uma etapa fundamental na preparação para concursos, é quando confrontamos a matéria estudada. Se bem que, quando começo errar questões sobre assuntos que já estudei, bate um senhor desespero, então, a saída é fazer uma releitura do conteúdo e respondê-la minuciosamente.


E a questão "disgramenta" de hoje foi essa:

Prova: FGV - 2012 - PC-MA - Delegado de Polícia - João e José, colegas de faculdade de Pedro, afirmaram no dia 01.03.2012, na presença de três amigos, que Pedro seria um “grande mentiroso”. Apesar de ter tomado conhecimento do ocorrido em 01.04.2012, Pedro convida João para sua festa de aniversário e este comparece. No entanto, consultando um advogado, decidiu oferecer queixa contra João e José em 30.08.2012. A peça inicial foi recebida pelo magistrado em 01.09.2012.

Diante do exposto, assinale a afirmativa correta.

a) A ação penal poderia prosseguir apenas em relação a José, mas não em relação a João, pois em face deste houve perdão.

b) A queixa poderia ser apresentada apenas contra José, pois o princípio da indivisibilidade aplica-se, primordialmente, nas ações penais de iniciativa pública.

c) A ação penal deveria ser extinta, pois verificado o fenômeno da decadência.

d) A ação penal deveria seguir seu curso normal em relação aos dois réus, em respeito ao princípio da indivisibilidade.

e) A queixa não deveria ser recebida contra nenhum dos réus, diante da renúncia ao direito de queixa com relação a João, exceto se houvesse discordância por parte de José.


R: Segundo o gabarito a Letra E está correta, mas, pelas razões abaixo, acredito que nenhuma das alternativas está correta.



No caso, João e José praticaram o crime de injúria em face de Pedro (CP, Art. 140). Isso porque emitiram conceito negativo sobre a vítima – “grande mentiroso”-, ofendendo-lhe a dignidade/decoro.

 Ao contrário da calúnia e da difamação, na injuria não há, em regra, imputação de fatos, mas opinião que o agente emite sobre o ofendido (fatos vagos, genéricos, difusos também configuram injúria).

Na injúria tutela-se a honra subjetiva do ofendido, ou seja, sua autoestima. Sendo assim, somente se consuma quando o fato chega ao conhecimento da vítima, pouco importando se proferida perante terceiros.

Sendo a injúria crime perseguido mediante ação penal privada da vítima ou do seu representante legal, são aplicados ao acusado vários institutos extintivos da punibilidade – vg. renúncia, perdão do ofendido, perempção -.

A renúncia ao direito de queixa é ato unilateral, ou seja, independe de aceitação por parte do suposto autor do delito. É também extraprocessual, sendo cabível ANTES do início do processo penal, além de ser irretratável.

No mais, a renúncia pode ser expressa ou tácita. Renúncia expressa é aquela feita por declaração inequívoca, assinada pelo ofendido, seu representante legal ou por procurador com poderes especiais (CPP, art. 50, caput). A renúncia tácita ocorre quando a vítima pratica ato incompatível com a vontade de processar (CP, art. 104, par. único). 

Ainda que ciente das imputações injuriosas, Pedro convidou João para sua festa de aniversário, atitude que implicou em renúncia tácita ao direito de queixa.

Por força do princípio da indivisibilidade, segundo o qual a queixa contra qualquer dos autores obriga ao processo de todos, a renúncia concedida a um dos coautores estende-se aos demais (CPP, art. 49). 

Ao renunciar tacitamente em relação ao acusado João, segundo a doutrina, ocorreu a extensibilidade dessa renúncia também em face de José.


Por fim, o STF entende que o prazo decadencial é extinto no momento do oferecimento da queixa-crime, pouco importando a data do seu recebimento (RHC 63.665/RS). Sendo a injúria levada ao conhecimento de Pedro em 01/04/2012, a partir de então iniciou-se o decurso do prazo decadencial de 6 meses, o qual se encerraria em 01/10/2012.

Explicado isso, passamos a analisar cada uma das alternativas.
 a) A ação penal poderia prosseguir apenas em relação a José, mas não em relação a João, pois em face deste houve perdão.
R: Não há que se falar em perdão, que é ato bilateral (depende do consentimento do acusado) e que ocorre no curso do processo penal. 

b) A queixa poderia ser apresentada apenas contra José, pois o princípio da indivisibilidade aplica-se, primordialmente, nas ações penais de iniciativa pública.
R: Uma vez ocorrendo a renúncia em face de um acusado, estende-se tal causa de extinção da punibilidade em relação aos demais (p. da indivisibilidade).
De acordo com o princípio da indivisibilidade, o processo criminal de um obriga ao processo de todos, havendo discussão a respeito da sua incidência na ação penal pública.
Parte da doutrina entende que, havendo elementos probatórios quanto a coautores e partícipes, aplica-se o princípio da indivisibilidade, obrigando o MP a oferecer denúncia em relação a todos.
Contudo, nos Tribunais Superiores, tem prevalecido o entendimento de que, na ação penal pública, vigora o princípio da Divisibilidade. O STJ já pronunciou que o princípio da indivisibilidade aplica-se tão somente à ação penal privada (CPP, art. 48)

c) A ação penal deveria ser extinta, pois verificado o fenômeno da decadência.R: Sendo a injúria levada ao conhecimento de Pedro em 01/04/2012, a partir de então iniciou-se o decurso do prazo decadencial de 6 meses, o qual se encerraria em 01/10/2012.

d) A ação penal deveria seguir seu curso normal em relação aos dois réus, em respeito ao princípio da indivisibilidade.
R: Havendo a renúncia tácita ao direito de queixa em relação a um dos autores do crime, exatamente em respeito ao princípio da indivisibilidade, obrigará tal renúncia em relação a todos.

 e) A queixa não deveria ser recebida contra nenhum dos réus, diante da renúncia ao direito de queixa com relação a João, exceto se houvesse discordância por parte de José.
R: Diferente do perdão, a renúncia é ato UNILATERAL, isto é, independe da aceitação do autor do crime. Irrelevante, portanto, eventual discordância de José em relação a renúncia perpetrada.
 
 
Força na peruca e bunda na cadeira, bravos concursandos!

 


 

quarta-feira, 4 de março de 2015

Decidi estudar para concursos públicos, e agora? (Parte 1: investigação pessoal)


Tal qual o Jack Estripador, vamos por partes, começando por uma boa investigação pessoal.
1º Qual concurso?
R: Para Promotor de Justiça, meu maior sonho. Porém, em razão das matérias afins, irei prestando outros das carreiras jurídicas estaduais, magistratura, defensoria, delegado, procurador do estado.
2º Quanto tempo tenho? (diário, semanal, mensal; se larguei tudo para estudar, em quanto tempo pretendo passar, etc)
R: De 8 a 10 horas diárias, sendo que, nos finais de semana, 4h no sábado e 4h no domingo. Minha meta é passar em três anos.
3º Em qual lugar irei estudar? (casa, biblioteca, escritório)
R: Em casa. Já providenciei o espaço, com porta, mesa, cadeira confortável, descanso para os pés, duas luminárias de mesa, apoio para livros, fichas para elaborar meus resumos, marca textos em várias cores (por ex. uso azul para jurisprudências do STJ e laranja para as do STF).
4º Quais materiais de estudo devo utilizar? (livros, apostilas, vídeo-aulas, resumos)
R: Em ordem de importância: livros de bons autores (dica: no fórum do correioweb sempre tem tópicos sobre bibliografia de vários cargos), resumo de aulas, meus resumos, lei seca.
5º Farei cursinho? (recursos financeiros x tempo disponível)
R: Não. Dinheiro e tempo curtos. Em caso de matéria complexa, aulas on-line (já evito de perder tempo no trânsito).
6º Estudarei uma ou várias matérias por dia? (máximo de tempo que consigo me manter concentrada em um mesmo assunto)
R: Já fiz o teste. Por um mês estudei apenas Direito Civil (li todo o livro do Flávio Tartuce, porém, nas últimas 4h de estudo do dia, lia em modo “automático”). Logo, máximo de 4h por dia em cada matéria.
7º Qual método de estudo? (somente leitura, leitura e grifos, resumos, esquemas, mapas mentais)
R: Depois de muitas tentativas e pesquisas, a melhor maneira MINHA de estudar é a seguinte: utilizo o último edital do concurso, leio o tópico da matéria na doutrina escolhida, leio novamente e grifo o que acho interessante, leio os grifos e elaboro meu resumo. Ou seja, leio 3 vezes o assunto. Depois, passo a ler apenas meu resumo. Claro que não consigo fazer isso para todos os assuntos do edital, já que não disponho de 10 anos para passar em algo, mas elejo os assuntos complexos, os que mais caem em prova, para estudar dessa forma. Elaboro meus resumos no computador (mais rápido), mas para assuntos corriqueiros em provas, também confecciono manualmente fichas com palavras chaves. Para minha maior fixação do conteúdo o ideal seria elaborar meus resumos todos manualmente, mas o tempo que gastaria seria enorme. Meu noivorido, por ex., tem uma boa memória, não precisa confeccionar resumos, apenas lê e grifa, e, para revisar a matéria, lê apenas os grifos.
 8º Do meu tempo diário de estudos em qual momento estou mais e menos produtiva/concentrada?
R: Meu caso, manhã e noite produtividade máxima, mas a tarde é sonolenta. Então, matérias difíceis pela manhã (assuntos novos, com menos afinidade), matérias que mais gosto pela tarde (elaborar resumos, resolver questões me forçam a manter a concentração), e, quando tenho tempo pela noite, resolvo questões e leio informativos.
 
Para lembrar: o sucesso da caminhada depende de um bom PLANEJAMENTO.

terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Prova discursiva do concurso para o cargo de DELEGADO DE POLÍCIA CIVIL DE RONDÔNIA, organizado pela FUNCAB, aplicado em maio de 2014.


Questão 2

Fernando adquire roupas em uma loja de um shopping center e efetua o pagamento com um cheque roubado, com o objetivo de obter indevida vantagem econômica. Na ocasião, após solicitação do caixa da loja, apresentou uma carteira de identidade falsa, eis que houve substituição de foto, em nome do titular do cheque apresentado. O fato foi descoberto pelo caixa que percebeu um acentuado nervosismo apresentado pelo consumidor.

Tendo em vista o acima exposto, fundamentadamente:

a.     Faça a devida capitulação penal do fato;

b.    Analise o cabimento de suspensão condicional do processo e de transação penal, no presente caso.

 

Resposta:

a.     Faça a devida capitulação penal do fato;

A conduta de Fernando, que paga por mercadorias com cheque roubado, se subsume ao caput do art. 171, do CP, combinado com o art. 14, II, também do CP, sendo-lhe aplicada a súmula 17 do STJ.

Pois bem.

Ao se fazer passar pelo titular da cártula, Fernando induz a vítima em erro (fraude). O estelionato é crime de duplo resultado, somente se consumando após efetiva obtenção da vantagem indevida, correspondente à lesão patrimonial de outrem. Fernando, inicialmente, consegue induzir a vítima em erro, porém, no momento da obtenção da indevida vantagem, é impedido por circunstâncias alheias à sua vontade consumar o delito (a vítima desconfia do acentuado nervosismo do agente.

Quanto ao uso de documento falso, de acordo com a Súmula 17 do STJ, quando o falso se exaure (esgota) no estelionato. Sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido. No caso, Fernando apenas apresentou a carteira de identidade falsa, porque solicitada pelo caixa, na tentativa de se fazer passar pelo emitente do cheque.

Esse entendimento decorre da aplicação do princípio de direito penal no qual o crime-meio é absorvido pelo crime-fim, que consubstancia o princípio da consunção (absorção).

 

b.    Analise o cabimento de suspensão condicional do processo e de transação penal, no presente caso.

Em tese, por se tratar de delito com pena mínima igual a 1 ano, Fernando faz jus a proposta de suspensão condicional do processo (isso se também preencher os demais requisitos objetivos e subjetivos do art. 89, da Lei 9.099/95). Além do que, ao se tratar de delitos tentados, a jurisprudência consolidou o entendimento de que "para efeito da suspensão condicional do processo, é de ser considerada a causa de diminuição da pena prevista no art. 14, II do CPB (crime tentado), aplicando-se, neste caso, a redução máxima (2/3) a fim de averiguar a pena mínima em abstrato" (STJ, HC n. 84608/SP, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Quinta Turma, j. 17.4.08).

Por outro lado, o mesmo não se pode dizer a respeito do instituto da transação penal (art. 76 da lei 9.099/95) já que restrito aos crimes de menor potencial ofensivo (pena máxima igual a 2 anos), sendo a pena máxima do estelionato 5 anos.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Prova discursiva do concurso para o cargo de DELEGADO DE POLÍCIA CIVIL DE RONDÔNIA, organizado pela FUNCAB, aplicado em maio de 2014.


Questão 1

Vinícius, com a concordância de sua companheira Aline, em janeiro de 2014, pratica com Herbert, filho desta e seu enteado, de apenas 11 anos, atos libidinosos diversos, o que ocorreu em quatro dias distintos no referido mês, sempre agindo, à noite, na casa do casal, do mesmo modo e nas mesmas condições. Aline assistia à violência sexual praticada e orientava Vinícius quanto a que ato libidinoso praticar contra seu filho. O fato foi levado, em março, ao conhecimento da autoridade policial que instaurou o procedimento próprio.

Diante desse quadro, fundamentadamente:

a.     Faça o devido e completo enquadramento penal para os envolvidos no caso;

b.    Aponte o tipo de ação penal a ser proposta;

c.      Aponte o prazo para conclusão do inquérito policial em questão.

 

Resposta:

a. Faça o devido e completo enquadramento penal para os envolvidos no caso;

Vinícius, padrasto de Herbert de apenas 11 anos de idade, praticou com este atos libidinosos diversos, em quatro dias distintos do mês de janeiro de 2014, sempre agindo à noite, em casa, do mesmo modo e nas mesmas condições.

Aline, genitora de Herbert, participou dessas ações delituosas, uma vez que consentiu, assistiu a violência, e , ainda, orientou Vinícius quanto a que ato libidinoso praticar contra seu filho.

Portanto, Vinícius incidiu no art. 217-A, do Código Penal – estupro de vulnerável, vítima menor de 14 anos -, com as majorantes dos incisos I e II, do art. 226, do Código Penal – até a quarta parte, pois o crime fora cometido em concurso de pessoas; até a metade, por ostentar a condição de padrasto da vítima -. No enquadramento da conduta não se aplica o disposto no art. 68, parágrafo único, do CP, já que se trata de faculdade judicial na escolha de uma só causa de aumento em caso de concurso.

Agiu Vinícius, ainda, em continuidade delitiva (art. 71, caput, do CP), pois que, por meio de quatro condutas, praticou crimes da mesma espécie -atos libidinosos diversos da conjunção carnal-, em condições semelhantes de tempo (em hiato inferior a 30 dias, já que todas as condutas foram praticadas em janeiro/14), lugar e modo de execução. Trata-se, na espécie, de crime continuado simples ou comum, aquele em que as penas dos delitos parcelares são idênticas, devendo ser aplicada a pena de um só dos crimes, aumentada de 1/6 a 2/3. Para o STF, o vetor para o aumento de pena entre 1/6 e 2/3 é a quantidade de crimes, exclusivamente. Neste caso, quatro crimes, o aumento na pena seria de ¼.

De sua parte, Aline, partícipe (não praticou o núcleo do tipo penal, mas concorreu para o crime) do delito praticado por Vinícius, incidirá nas penas do art. 217-A, do Código Penal, com as majorantes dos incisos I e II, do art. 226, do Código Penal, combinado com o art. 29, caput, do mesmo Codex (norma de extensão pessoal para atribuir eficácia penal a conduta acessória do partícipe), em continuidade delitiva (art. 71, caput, do CP).

b. Aponte o tipo de ação penal a ser proposta;

De acordo com o art. 225, parágrafo único, do CP, por se tratar de vítima menor de 18 anos (e também nos casos de pessoa vulnerável), a ação penal é pública incondicionada, de titularidade do Ministério Público.

 
c. Aponte o prazo para conclusão do inquérito policial em questão.

A questão não menciona se os indiciados encontram-se presos, soltos ou afiançados. Na hipótese de prisão em flagrante ou preventivamente, conforme consta no art. 10, caput, do CPP, o inquérito deverá terminar no prazo de 10 dias, ou no prazo de 30 dias, quando estiver solto, mediante fiança ou sem ela.